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Magistrado fala sobre a aplicação das leis contra políticos corruptos

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O titular da Vara Criminal de Sena Madureira, Fábio Farias, condenou oito pessoas pelos delitos de apropriação ou desvio de bens ou rendas públicas (crime de responsabilidade) e falsidade ideológica. Entre as pessoas julgadas estão o ex-prefeito Nilson Roberto Areal de Almeida e a diretora financeira da prefeitura Cecília Teixeira de Souza, que foram sentenciados à pena de prisão em regime fechado.

O magistrado que tem mais de 15 anos de experiência na área jurídica, atuando há três anos na Vara Criminal, afirmou que a Lei de Improbidade Administrativa representou um avanço na busca pela responsabilização de gestores que deixam de aplicar o recurso público para realizar o desvio do dinheiro para proveito próprio e em benefício de apadrinhados políticos.

Ele aproveita para criticar a falta de atualização da Lei Penal e do Código de Processo Penal, que apresentam penas brandas e uma quantidade de recursos que colaboram para a sensação da impunidade.

O juiz Fábio fala sobre a legislação que vem penalizando políticos corruptos:

 

Repórter – Temos visto o julgamento de muitos gestores nos últimos anos. O senhor acredita que a legislação atual garante a punição dos culpados ou seria necessário que existisse uma atualização?

Magistrado – De início, necessário esclarecer que o gestor da coisa pública responde por seus atos em três esferas – administrativa, civil e penal. No que tange à primeira, nosso país possui arcabouço legislativo moderno, satisfatório, proporcional e preciso em seus instrumentos de punibilidade, a exemplo da lei de improbidade administrativa (Lei n. 8.429/92), inspirada no modelo alemão e que possibilita ao julgador do caso aplicar as sanções de perda da função pública, ressarcimento integral do dano e suspensão dos direitos políticos por até dez anos, sempre respeitando os preceitos constitucionais do devido processo legal.

O mesmo não se pode dizer sobre o aspecto penal, cujas leis são obsoletas e com previsibilidade de penas relativamente baixas para o mau gestor,            a exemplo do Decreto-Lei n. 201 (crimes de responsabilidade de prefeitos e vereadores), editado nos anos 60.

Outro ponto a merecer grande destaque para possível reforma é o Código de Processo Penal, de 1941, cujas disposições permitem uma série infindável de recursos das mais variadas espécies (muitos de natureza protelatória), aumentando a sensação de impunidade e contribuindo para o descrédito das instituições junto à sociedade.

 

Repórter – O senhor acredita que a quantidade de políticos julgados e condenados por irregularidades representa um marco para a sociedade?

Magistrado – Certamente; e muito contribuiu para isso o recrudescimento dos órgãos de controle – Tribunais de Contas, Corregedorias, Ministério Público etc.,          e do Poder Judiciário, que passou a volver com outros olhos processos dessa estirpe, a exemplo da Meta n. 04/2018 do Conselho Nacional de Justiça, a qual fixa prioridade de julgamento para casos relativos à corrupção e à improbidade administrativa.

Além das metas, o CNJ criou o cadastro nacional de condenações cíveis por ato de improbidade administrativa e por ato que implique inelegibilidade, excelente ferramenta à disposição de todos para otimizar e aferir transparência a Administração Pública.

Repórter – Cientistas políticos e historiadores sempre afirmam que a corrupção faz parte da história do Brasil. O senhor acredita que um dia teremos alguma mudança?

Magistrado – Há corrupção desde que o mundo é mundo e sempre existirá porque não temos um sistema sócio-jurídico perfeito. Esse mal ocorre em todos os países,      em maior ou menor escala. O que se deve ter em mente é o seu controle para níveis toleráveis.

No que diz respeito ao Brasil, já vejo uma mudança de horizonte e a operação lava-jato (e seus desdobramentos) está aí para mostrar justamente isso:             as pessoas mais poderosas do país no cenário econômico e político presas ou sob constante ameaça de prisão, uma verdadeira quebra de paradigma.

Tal mudança se deve (e muito) à utilização de ferramentas eficazes de combate, tais como: colaboração (delação) premiada, interceptação telefônica, escuta ambiental, agente infiltrado e bloqueio de bens e valores; além da (re)interpretação constitucional que possibilitou a prisão de acusados após julgamento em segunda instância, fixada pelo STF em fevereiro de 2016 e confirmada pela corte em outras duas ocasiões, novembro e outubro de 2017.

Resta claro que em alguns momentos ocorreram desacertos na utilização desses mecanismos e na mudança de postura no enfrentamento à corrupção –existem críticas justas de estudiosos nesse sentido. Porém, seu alcance, eficácia e célere aplicabilidade das sanções inerentes superam (e muito) ditos “efeitos colaterais”.

Cabe agora à sociedade organizada extrair lições dessas mudanças, debater, aprimorar mecanismos e evoluir, sempre com o norte de, se não erradicar, diminuir ao máximo essa doença que tanto nos aflige. Decerto, só assim poderemos vislumbrar um futuro melhor para o nosso país.